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O homem sensato é aquele que se surpreende com tudo.
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O apetite de saber nasce da dúvida. Deixa de acreditar e instrui-te!
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Não se pode, ao mesmo tempo, ser sincero e parecê-lo.
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Não se faz boa literatura com boas intenções nem com bons sentimentos.
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Não se descobrem novas terras sem se largar de vista a costa, durante muito tempo.
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Não pode haver senão vantagem num acordo e prejuízo num conflito.
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Não há problemas; apenas há soluções. O espírito de homem, depois, inventa o problema.
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Invejar a felicidade alheia é loucura: não nos saberíamos servir dela. A felicidade não se quer de confecção, mas sob medida.
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Encontrar uma boa fórmula não basta, trata-se de não a abandonar.
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É em nome da fé que se mata.
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Múcio Leão :
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A poesia que desce ao poeta :
Poeta, ser estranho, ser enigmático entre os seres!
Vejo-o, isolado das cores, das formas e das ideias,
Isolado, nessa crepuscular solidão que o acompanha.
E é então que vejo descer sobre ele
Uma como sombra de celestiais eflúvios:
- A Poesia, a Poesia de inesperadas ressonâncias,
A grande Poesia, que é uma exalação indefinível,
Que é um som infinito, vindo de outras esferas,
Que é a comunicação miraculosa de outros seres
e de outras regiões.
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A Thanksgiving Prayer - William S. Burroughs :
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dia de ação de graças, 28 de novembro de 1986 :
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agradeço pelo peru selvagem e os pombos passageiros, destinados a virar merda nas saudáveis tripas americanas.
agradeço por um continente a espoliar e envenenar.
agradeço pelos índios por garantirem uma módica dose de desafio e perigo.
agradeço pelas vastas manadas de bisões para matar e depelar e depois deixar as suas carcaças à putrefação.
agradeço pelos troféus de caça de lobos e coiotes.
agradeço pelo sonho americano, por inventar lorotas até que elas brilhem à luz do dia.
agradeço pela klu klux klan. aos policiais que matam negros e os contabilizam. às decentes beatas de igreja com suas mesquinhas, interesseiras, feias e perversas caras.
agradeço pelos adesivos de “mate uma bicha em nome de jesus cristo.
agradeço pela aids de laboratório.
agradeço pela proibição e pela guerra contra as drogas.
agradeço por um país onde a ninguém é permitido cuidar da seus próprios problemas.
agradeço por uma nação de dedos-duros.
agradeço, sim, todas as lembranças – ok, deixa eu ver o que você tem nas mãos!
você foi sempre uma dor de cabeça e uma encheção de saco.
agradeço pela última e maior traição do último e maior sonho dos sonhos humanos.
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(tradução de leo gonçalves)
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Em seu lugar - Felipe Fortuna :
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Arrumo livros
como lembro os rostos,
de memória. Limpo livros
a me esgueirar
por estantes e frestas,
esgrima. Depois
volto a flagrar as lombadas
queimadas de luz
e de gordura dos dedos
(o corpo continua a penetrar
cada leitura).
Ali estive, aquele ali fui eu,
aqui me reencontro,
estranho antes e depois.
Ninguém fala o título:
ele mesmo
soletra a sua inclusão
e se perfila, agora convocado.
Daqui observo, perto e de rapina,
o livro que li e volta para a fila:
sua lombada erguida frente
à dúvida, que não termina.
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Gustave Flaubert :
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"O que o dinheiro faz por nós não compensa o que fazemos por ele."
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. Trovas a Inês de Castro - Garcia de Resende : . .
"Estes homens d'onde irão?" Qual será o coração A minha desaventura Eu era moça, menina, Começou-m’a desejar Dei-lhe minha liberdade, Estava mui acatada, Como as cousas qu’hão de ser E quando vi que descia, “Não possa mais a paixão “E tem tão pouca idade “Lembre-vos o grand’amor “Mas, pois eu nunca errei El-rei, vendo como estava, Que, se m’ele defendera Com seu rosto lagrimoso, “-Senhor, vossa piedade “Se a logo não matais, “Com sua morte escusareis E ouvindo seu dizer, E vendo que se lhe dava
Dous cavaleiros irosos, |
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"The Stones" - Sylvia Plath :
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As Pedras :
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Esta é a cidade onde os homens se consertam.
Repouso num grande leito.
O raso e azul círculo celeste
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Voou como o chapéu de uma boneca
Quando abandonei a luz. Entrei
No estômago da indiferença, o armário mudo.
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O maior dos almofarizes diminuiu-me.
Tornei-me num seixo imóvel.
As pedras da barriga estavam tranquilas,
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A lápide (2) serena, nada a perturbava.
Só a abertura da boca (3) sibilava,
Grilo inoportuno
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Numa pedreira de silêncios.
As pessoas da cidade ouviram-no.
Procuraram as pedras, taciturnas e separadas,
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A abertura da boca gritava as localizações.
Ébria como um feto
Sugo a polpa das trevas.
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Os tubos de alimentação abraçam-me. Esponjas beijam-me e retiram-me os líquenes.
O joalheiro manuseia o cinzel, descerra
E força a abertura de um olho de pedra.
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Isto é o pós-inferno: vejo a luz.
Um vento abre a câmara
Do ouvido, esse velho preocupado.
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Água apazigua o lábio de sílex,
E a luz do dia derrama a sua monotonia na parede.
Os enxertadores estão alegres,
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Aquecendo as tenazes, içando os delicados martelos.
Uma corrente agita os fios
Volt após volt. Pontos remendam-me as fissuras.
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Um operário passa trazendo um torso róseo.
Corações enchem os armazéns.
Esta é a cidade das peças sobresselentes.
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As minhas pernas e braços enfaixados emanam um doce cheiro a borracha.
Aqui eles recompõem cabeças ou qualquer membro.
Às sextas, as crianças vêm
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Trocar os seus ganchos por mãos.
Os mortos deixam olhos para outros.
O amor é o uniforme da minha enfermeira calva.
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O amor é o osso e tendão da minha praga.
O vaso, reconstruído, abriga
A rosa esquiva.
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Dez dedos moldam uma taça para sombras.
Os meus remendos fazem comichão. Não se pode fazer nada, incomoda, mas
Ficarei como nova.
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(2) Trocadilho: head-stone significa lápide e Plath também insinua, “cabeça de pedra”.
(3) Literalmente, é a abertura da boca numa máscara (mouth-hole).
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Tradução de David Furtado
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Tu estás aqui - Ruy Belo :
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Estás aqui comigo à sombra do sol escrevo e oiço certos ruídos domésticos e a luz chega-me humildemente pela janela e dói-me um braço e sei que sou o pior aspecto do que sou Estás aqui comigo e sou sumamente quotidiano e tudo o que faço ou sinto como que me veste de um pijama que uso para ser também isto este bicho de hábitos manias segredos defeitos quase todos desfeitos quando depois lá fora na vida profissional ou social só sou um nome e sabem o que sei o que faço ou então sou eu que julgo que o sabem e sou amável selecciono cuidadosamente os gestos e escolho as palavras e sei que afinal posso ser isso talvez porque aqui sentado dentro de casa sou outra coisa esta coisa que escreve e tem uma nódoa na camisa e só tem de exterior a manifestação desta dor neste braço que afecta tudo o que faço bem entendido o que faço com este braço Estás aqui comigo e à volta são as paredes e posso passar de sala para sala a pensar noutra coisa e dizer aqui é a sala de estar aqui é o quarto aqui é a casa de banho e no fundo escolher cada uma das divisões segundo o que tenho a fazer Estás aqui comigo e sei que só sou este corpo castigado passado nas pernas de sala em sala. Sou só estas salas estas paredes esta profunda vergonha de o ser e não ser apenas a outra coisa essa coisa que sou na estrada onde não estou à sombra do sol Estás aqui e sinto-me absolutamente indefeso diante dos dias. Que ninguém conheça este meu nome este meu verdadeiro nome depois talvez encoberto noutro nome embora no mesmo nome este nome de terra de dor de paredes este nome doméstico Afinal fui isto nada mais do que isto as outras coisas que fiz fi-Ias para não ser isto ou dissimular isto a que somente não chamo merda porque ao nascer me deram outro nome que não merda e em princípio o nome de cada coisa serve para distinguir uma coisa das outras coisas Estás aqui comigo e tenho pena acredita de ser só isto pena até mesmo de dizer que sou só isto como se fosse também outra coisa uma coisa para além disto que não isto Estás aqui comigo deixa-te estar aqui comigo é das tuas mãos que saem alguns destes ruídos domésticos mas até nos teus gestos domésticos tu és mais que os teus gestos domésticos tu és em cada gesto todos os teus gestos e neste momento eu sei eu sinto ao certo o que significam certas palavras como a palavra paz Deixa-te estar aqui perdoa que o tempo te fique na face na forma de rugas perdoa pagares tão alto preço por estar aqui perdoa eu revelar que há muito pagas tão alto preço por estar aqui prossegue nos gestos não pares procura permanecer sempre presente deixa docemente desvanecerem-se um por um os dias e eu saber que aqui estás de maneira a poder dizer sou isto é certo mas sei que tu estás aqui |
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A Passionate Sheperd To His Love - CHRISTOPHER MARLOWE :
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El pastor apasionando a su amada :
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ven a vivir conmigo y mi amor sé ;
todos los placeres hemos de probar,
valles, prados,colinas y campos
bosques e intrincadas montañas nos dejaran.
Y nos sentaremos en las rocas,
viendo los pastores a sus rebaños alimentar,
por riachuelos , en cuyas caidas
madrigales de melosiosas aver oiremos cantar.
Haremos yacijas de rosas,
y de fragantes ramilletes , un millar;
y un sombrero de flores y , con hojas de mirto,
una faldilla vamos a bordar.
Un vestido hecho con la mas fina lana,
sacada de nuestras hermosas ovejas;
para el frio, ajustadas zapatillas
y de oro puro sus hebillas.
Los pretendientes del pastor bailaran y cantaran
para tu regocijo cada mañana de mayo;
si estos deleites te logran conmover,
entonces vive con migo y mi amor sé.
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Destino da Beleza - Augusto Frederico Schmidt :
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Quando o tempo desfaz as formas perecíveis
Para onde vai, qual o destino da Beleza,
Qual a expressão da própria identidade ?
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Na hora da libertação das formas,
Qual o destino da Beleza, que as formas puras realizaram ?
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Qual o destino do que é eterno
Mas está consignado no efémero,
No momento inexorável da purificação ?
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A Beleza não morre.
Não importa que o seu caminho
Seja visitado pela destruição, que é a própria lei,
E pelas sombras.
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A Beleza não morre,
Deus recolhe as flores que o tempo desfolha;
Deus recolhe a música das fisionomias
que o tempo escurece e silencia;
Deus recolhe o que venceu as substâncias frágeis
E realizou o milagre do Espírito Impassível
no movimento e na matéria.
Deus recolhe a Beleza, como o corpo absorve a sua sombra
Na hora em que a luz realiza o seu destino de unidade e pureza.
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